quarta-feira, 28 de julho de 2010

Heart Shaped Home


O meu coração - disse o poeta - é uma casa com muitos quartos, caiada pelos crepúsculos, soalho flutuante esvoaçante, telhas moldadas dos sedimentos da espera: os ideais que o Tempo teima em transformar, as pequenas promessas traídas, os vislumbres e as saudades do que não se viveu ou viverá jamais.


O poeta decalca o mundo sobre uma folha de papel animal, e procura perder os nomes às coisas porque - Os nomes escondem as coisas como uma caixa de cartão onde se lê “Este lado para cima” em todos os lados.


O meu coração é uma casa com muitos quartos, ocupados por gente que partilha o mesmo rosto, o meu, mas se distingue pela cor dos olhos e pelas colecções que faz.


O poeta aprendeu a dormir com os pés de fora da cama para melhor voar enquanto sonha e a cobrir-se com a previsão meteorológica dos jornais de amanhã – Temperaturas amenas, leve brisa com cheiro a terras distantes.


O meu coração é uma casa com muitos quartos e grandes varandas viradas a Ti, que desconheço e me iluminas. Quando chove, o meu coração é um barco e deriva; Varanda-Bote-Salga-Vidas…


O poeta já não procura a verdade – Nuvens ao vento, coelho.. rosto de velha.. foguetão rumo à lua - mas algo em que acreditar - A esperança é uma manta de retalhos à procura de linhas com que se cosa.


O meu coração é uma casa, construída quarto a quarto, por mãos inquietas que sempre ignoraram quem lhes determina o gesto e que nunca irão reconhecer a Paz que encontram repousadas no contorno de um outro corpo.

sábado, 19 de junho de 2010

ESTOU A CHEGAR ÀQUELA IDADE...

Estou a chegar àquela idade:

"Em que os pensamentos se atropelam e as ideias se amontoam."

Em que não páras mas abrandas...

Em que finalmente alguma poeira começa a assentar, depois de tanta correria, sem sentido aparente...

Em que conquistas a tua independência, mas não queres estar sozinho...

Em que respiras fundo, só para sentir que estás vivo...

Em que contemplas o que te rodeia com paixão e serenidade...

Em que cada vez sabes menos...

Em que as pessoas mais idosas que admiras, respeitas e amas te deixam ou ameaçam...

Em que conheces muita gente mas cada vez tens menos amigos...

Em que pela primeira vez sabes o que é a saudade...

Em que te apetece dizer "eu amo-te" todos os dias...

Em que dizes "eu amo-te" todos os dias...

Em que começas a apreciar o vinho...

Em que não te assustas com os poucos cabelos brancos...

Em que ainda não tens 30, mas os teus 20 já lá vão...

Em que os teus heroís envelheceram...

Em que tu envelheceste mais que os teus heroís...

Em que já és mais velho que a média de idade dos jogadores da bola...

Em que algumas portas se fecharam para sempre...

Em que descobres novos caminhos...

Em que aprecias mais o Sol que a Lua...

Em que preferes a qualidade...

Em que ainda queres alguma quantidade...

Em que queres, mas já não podes mandar tudo à merda...

Em que perdes tempo com nostalgias...

Em que aprecias melhor o presente...

Em que cada vez ligas menos ao futuro...

Em que discutes coisas como "estou a chegar àquela idade"...

Em que achas que já é tarde e precisas de te deitar porque amanhã trabalhas...

Em que dizes "Foda-se! Caralho! Onde é que me inscrevo"...

Em que o teu maior desejo é a paz de espírito...

sexta-feira, 18 de junho de 2010

"E aqueles, que por obras valerosas Se vão da lei da morte libertando"


Hoje liguei a televisão e senti um calafrio...

Não se falava de futebol ou de circo político ou de velhinhas paraplégicas a viver num 5º andar (sem elevador) a cuidar do sobrinho com paralisia cerebral...

Falavam de José Saramago.

O Saramago, como nos habituámos a chamá-lo com a familiaridade com que nos referimos às figuras públicas mas também, para mim, para muitos, certamente mais a partir de hoje, com aquela admiração com que se recorda os professores que nos ficam na memória por terem feito mais do que passar-nos informação, por nos terem feito crescer.

Quando liguei a televisão percebi imediatamente o que se passara,
porque o víamos já há algum tempo a andar de mão dada com a morte e porque não temos por hábito homenagear espontâneamente aqueles contribuem e contribuíram como ele para a riqueza da nossa cultura, da nossa Língua, quem com palavras, embala e incita, revolta e acalma, a dúvida que nos faz ser, que nos faz seres...

A surpresa não foi a sua morte, mas o facto de sentir que acabara de perder algo que desconhecia pertencer-me.
Não sou dado a patriotismos, bandeira, hino, heróis (de)cantados do mar ou falsos heróis de relva. Sou o que levo comigo onde quer que esteja, gente, imagens, sabores e cheiros do "meu" Portugal.
Sou a cada instante as minhas palavras, a nossa Palavra, aquela em que penso e em que sinto.
Tenho por isso orgulho que as minhas palavras, o que elas comportam e e podem comportar, sejam também as dele, que tão bem as soube tratar.

Esta é a minha modesta homenagem ao escritor, ao Humano, José Saramago. Não será eterno, como nada pode ser, mas o que nos deixa, foi e continuará a ser por muito tempo, infinito...


sábado, 5 de junho de 2010

Minesweeper


Bem sei que cedo frequentemente à atracção do humor escatológico, e que o faço uma boa parte das vezes mais por preguiça ou falta de inspiração (porventura a mesma coisa?), do que por incapacidade para criar algo mais civilizado. Não obstante, o relato que se segue é verídico (não creio ter capacidade para poder te-lo inventado) e achei relevante partilhá-lo por razões que a seu tempo serão reveladas.

Por estas e outras, rogo paciência.


Bairro Alto. Uma noite como outras numa rua como tantas. Um senhor dos seus setenta anos passeia uma daquelas amostras caninas de pelo negro encaracolado. O objectivo do passeio não é, já o sabemos, o Átila esticar as pernas ou apanhar ar, mas cumprir com uma das inevitabilidades da sua natureza.

Fareja, contorna, fareja, arqueja, hesita, contorna, arqueja e... Átila observa o seu dono com um pequeno focinho constrangido enquanto deposita uma, um pouco mais ao lado....... duas, um metro à frente.....................t..........tre................três. Pelo abanar de cauda satisfeito, já está.

O dono, solícito, de lenço de papel na mão, debruça-se a custo e apanha uma, um pouco mais ao lado...... não... só uma?
Cataratas, reumático e/ou princípio de demência que afecte o dom milenar de contar até três, são algumas justificações que me ocorrem de repente. Mas eis que, antes que a poeira assente e o cheiro dissipe, Átila se prepara para nova investida, desta vez do outro lado da rua.


Um aparte. Não se deve questionar os desígnios defecais dos cães; milhões de anos antes do aparecimento da calçada portuguesa, da sola de borracha com sulcos profundos e desenhos intrincados e (valha-nos) do saquinho de plástico preto, já os antepassados dos nossos melhores amigos andavam por aí a brincar ao "juntar os pontinhos" por obra e graça (eu diria que mais por graça) de um qualquer capricho evolutivo. Tenho dito.


Átila volta à carga, fareja, contorna, arqueja.... Já sabem.
Desta feita, o dono, de um único agachamento conseguiu recolher tudo (só mais uma) e o lencinho de papel com indesejado conteúdo foi, à falta de um caixote de lixo a menos de cinco metros de distância e após uma mera fracção de segundo de hesitação, depositado junto à parede, fora do caminho, (claro está) junto de outros detritos (isto é importante), numa daquelas acumulações espontâneas e frequentes no Bairro Alto a que os estudiosos chamam "lixo vadio".


Quem teve a capacidade (desde já agradeço) para ler até este ponto estará a pensar - Pois pois, muito bonito. E a prometida raison d'etre (o leitor fala francês, que bem...) que me levou a dedicar minutos preciosos da minha existência ao que me parece simplesmente um exercício de estilo acerca de um cão a cagar, onde está? Onde? ONDE?

Passo a explicar. A razão de coiso deste relato, é que após os acontecimentos, me tenha ocorrido que o que acabara de presenciar podia ser encarado como uma metáfora quase perfeita do estado global das coisas no quotidiano da nossa querida praia lusitana.
Não vou apresentar uma análise detalhada para justificar a minha opinião, deixo a procura e descoberta a cada um na medida das suas motivações. Fica no entanto um último apontamento em jeito de epílogo.


Cerca de cinco minutos após o senhor e cãozinho terem ido embora passavam duas senhoras. Passo a citar livremente o que ouvi de uma delas:

"(...)pisei qualquer coisa, será que... pode ter sido... deixa cá ver..... Shiiiiiiat!!"

domingo, 30 de maio de 2010

Fucking Trees!!

Esperma de árvore por toda a parte!!

Obstrução nasal, comichão nos ouvidos e garganta, e o carro, onde quer que o deixe, transformado numa espécie de pega-monstro sobre rodas.


Sinto-me apanhado no fogo cruzado de cum-shots, num mega gang bang vegetal.


Já pensei mudar de nome para Gina Lovewood...


sexta-feira, 28 de maio de 2010

ADORO


Voltei num dia de trovoada...


Sob uma imensa tempestade, num local que se apelida de Arenales del Sole em terras d'EL Rey de Castella, ressuscito a minha disponibilidade de contribuir para este blog.
A patetice vai continuar...



Passo a citar

"I've grown too old too fast, faster than the years have passed."

William Snow, The Lay of The Land (1932)

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Obrigado, pela parte que me toca!

Seja nos transportes públicos, elevadores, discotecas ou outros locais atreitos a passagens estreitas, não consigo evitar que a alma me sorria um sorriso bem largo quando um bom par de mamocas se me roça no pelo.

Advertência*
Nenhuma mulher foi objectificada (não de uma maneira má) na produção deste comentário. Quanto a este último... Também não.

* Dorme agora, o autor, um sono mais tranquilo.

terça-feira, 11 de maio de 2010

No more Mr Nice Guy

Mudei de ideias! 'Tou farto do Papa!

Sim, o senhor só cá está há umas horas, mas a verdade é que a presença acaba por ser constante.

Não admira que a percentagem de agnósticos e ateus esteja a disparar na Europa, estes tipos são uns empatas! Para não comentar as falhas generalizadas de tal decadente instituição e seu representante máximo, que são coisas que me levam à beira de um ataque convulsivo (não está aqui ninguém para me impedir de sufocar com a minha própria língua); trânsito parado, função pública parada (mesmo o que eles precisavam, mais um dia de folga!!) e no geral uns milhares de cérebros parados a sonhar acordados com um senhor idoso em vestido de noite (é o que aquilo é, não?).

Estava a tentar levar a coisa na desportiva, como se fosse daquelas situações sem remédio; o carro precisa de uma panela de escape nova, a consulta do dentista, o vulcão da Islândia, enfim...
Mas fechar os olhos à quantidade estúpida de dinheiro que se está gastar e perder com isto, e ao facto de estarmos a acolher com pompa um cúmplice comprovado em crimes de pederastia (ainda ninguém se apercebeu?)... Shame on me!!

No entanto, bem vistas as coisas, o País em que os brandos costumes, têm por costume revelar-se na brandura da justiça para com a pedofilia (é mesmo necessário nomear os casos?) será sem dúvida o melhor para fornecer o conforto e adulação cega de que o pobre Papinha estará tão necessitado por estes dias.

Não, não dá simplesmente para sorrir conformado e ver passar o Papa, mas à falta de algo mais significativo para dizer que não implique a rotura de umas artérias no lobo pré-frontal, despeço-me com manifesto desagrado e tique nervoso no canto do olho, algo envergonhado pela falta de firmeza que me levou às palavras moles do último post.

Fica uma mera ilustração... mensagem a quem de direito...